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domingo, 14 de outubro de 2012

pensar num título

Tem lugar mais distante que minha casa?
Posso permanecer imaginando um fora;
posso passar pelas notícias distantes que se multiplicam nas redes sociais;
posso sufocar sem ninguém perceber antes de apodrecer;
posso enlouquecer raciocinando socialmente;
posso mergulhar na superfície da pele;
posso arrancar cada pedaço de pele;
deixar cada dente abandonado numa função alimentar;
posso comer minha própria carne quando nenhum roedor, barata, formiga, livro restar;
posso agonizar com um sorriso sincero;
posso perfumar as roupas;
posso comer os melhores resultados da arte culinária;
posso fotografar cada canto do nada;
posso deixar cair todas as cordas bambas.
Posso voar, assim como faço volta e outra, nos meus sonhos.
Através de um impulso alcançado por um pulo atinjo alturas de pássaro, de balão. Mas para me manter em suspenso tenho que concentrar nesse impulso.
E, como em tudo, há um risco. Perder a gravidade é subir para sumir ou cair para morrer.
Dos meus sonhos, sempre, que eu lembre, há algum elemento de morte.
E a queda é um constante perigo. ou me acontece pela metade, pois nunca me deixei cair completamente, sempre desperta quando começo a cair, ou melhor, quando me dou conta, por sentido físico de susto, que está acontecendo.
Fato é que posso voar. Porque tenho uma técnica que pode ser repetida em mais de um sonho. E se pode ser repetido, não é real?
Mas o que não me conforma é ser ilusão.
Fazer não deixa tempo para angústias, porque deixa os problemas no mundo entre coisas para além da vontade.
A questão toda é que nos abriram para as vontades ao mesmo tempo que comprimem o tempo do fazer libertário.
Mas tudo isso, se resolve tautologicamente nesse caso, fazendo! Até alcançar algo que leve o sentido à uma intensidade explosiva. Pois nem sempre o ato começa, acontece plenamente. Sobre isso: há um entendimento que escapa, uma vez que pelos mesmos meios não se passa pelos mesmos prazeres.
Por que somos tão impossíveis diante do prazer?
Por que ele faz quando e como quer?
Talvez não exista essa animalidade que institui prazer. Talvez seja tudo uma questão de circunstancia.
Então, tudo complica.

terça-feira, 5 de junho de 2012

Frios

Alguns frios são de velhice. Porque o corpo congela com maior insistência e reclama dança para fazer o sangue esquentar e gastar o tapete da sala, para gastar calçada. Os frios de velhice são aqueles que não suportam mais banho sem aquecedor. Naquele momento que se pára para pensar como foi possível passar tantos invernos tirando a roupa unicamente sob a bruma de um chuveirinho elétrico de ferragem da esquina. O frio da velhice reclama chá, chimarrão, reclama muita água. Frio da velhice relembra uma série de frios da juventude. Lembra até da neve de 199... talvez 2. Frio da velhice não lembra com precisão porque memória vai além de precisão, vai pela vontade... aquela neve e um blusão amarelo que ia até o joelho numa foto com irmã, naquele contraste de verde com branco com cores de criança e cinza do muro onde empoleiradas fazíamos pose. Que vontade! Da neve, dos dedos congelados porque se brincava sem luvas. O frio da velhice é dedos congelados mesmo de tanto trabalhar com o teclado do computador. O frio da velhice precisa de luvas e de meias de lã também. O frio da velhice não vem na velhice somente, ele vem porque vem, sem mais nem menos. Fogão a lenha, casa aquecida embaixo da mesa. Voltar no frio da infância. Que frio interessante. Frio despreocupado. Divertido. Frio da velhice também, porque pode com vinho, queijos, pães e comidas quentes, naquele paladar que frio da infância despreza. Frio da velhice deixa passar devaneio e frio da infância deixa passar fantasia. Vice e versa. Frios fazem formigas, baratas, moscas, mosquitos irem para não sei qual outro universo. Será que todos morrem? Pensamento cruel, porque fiquei na torcida com uma carinha de: "imagina se fosse verdade!". Pelo menos no inverno esses animais nos deixam em casa sem grandes surpresas num frio de velhice quieto. Não sei por que, mas alguns frios são redondinhos, redondinhos.