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sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Suportar ou não, eis a questão:

Alexander Pivato
Duas palavras: não suporto!
Não suporto sapatos apertados; ressaca; caras feias. Não suporto a barulheira e a sujeira das reformas em edificações; o lixo das ruas e das cabeças; o calor de quarenta graus em Porto Alegre. Não suporto parar de fumar, mas estou me torturando; deixar de beber no meio da festa, porém me obrigo para não esquecer de mim; marcar encontro no Odeon e tomar o chop sozinha, não pelo chop, mas pela expectativa de conversar com alguém. Não suporto comida sem tempero, fria, mal feita porque não posso com pessoas que fazem as coisas sem imprir sentido (que seja qualquer sentido - para marcar uma potencialidade de discussão); cerveja quente no Brasil; vinho azedo e gente apoiada no balcão com ar de superioridade. Não suporto conversas sobre negócios, pois nesses momentos todos parecem estar muito bem financeiramente, todos parecem saber perfeitamente a fórmula do sucesso, todos parecem tranquilos com os cafezinhos ou com a rodada de bebidas e todos efetivamente ignoram a conta no final. Não suporto notícias sobre a situação nacional porque o nacional é tão Brasília; representantes estudantis com palavras de ordem copiadas e coladas de cinqüenta, sessenta anos atrás (o problema não está nas palavras do passado, mas na atitude de cópia); políticos oportunistas que aprendem a piscar os olhos na hora certa, abraçar, acenar, apertar as mãos e sair sem responder as questões. Não suporto ser atravessada por perspectivas mesquinhas: eu uso tal, tu usas tal, ele/ela usam tal, nós usamos tal e se usares outra coisa: olhares de desprezo, risinhos cínicos. Às vezes eu não suporto gente! E não me suporto por insistir em desvendar vida e por falhar, falhar em cada palavra.