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segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

O Natal de Um Homem Chamado X

"Eu pensei que todo mundo fosse filho de papai noel...". A história é que uns são mais filhos que outros. Frase possível graças a experiência de nosso amigo Um Homem Chamado X. 
X desligou-se um tempo do mundo, tirou aquelas férias e ficou perambulando pela cidade porque não teve dinheiro para viajar. Resolveu pensar na vida. E entre uma escapada e outra do pensamento lembrou-se do episódio da última noite de natal, em 25 de dezembro de 2010.
Que dia horrível, um calor infernal e tenho que sair de casa para encontrar os familiares, comer churrasco, falar que minha vida no escritório anda bem sem ninguém entender o que faço dentro daquelas quatro paredes, em frente ao computador o dia inteiro. Os olhos da minha prima, sempre aqueles olhos dizendo que o que eu faço é não fazer nada, é no fundo ganhar dinheiro às custas do governo. E os tios, sempre falando de negócios bem sucedidos. Como podem ser tão bem sucedidos? Me questiono ano após ano. Uma voz que diz: é o trabalho. Tem-se que trabalhar duro para ser alguém na vida. Que vida, alguém de que tipo de vida? Sempre essa conversa e eu cada vez mais suscetível a um ataque de nervos, como diziam antigamente, como a psiquiatria também dizia. Muito bem, louco de doença dos nervos para os médicos, doente para os doentes. Ficar nessa mesa tomando cerveja para saber que tudo vai bem com todos, menos comigo. Se eu falar que tudo isso é uma mentira, que esse meu terno de linho me custou várias prestações, que queria muito um chapéu Panamá que ainda não consegui comprar, que cumprimentar todos com abraço e beijo me cança. A verdade é que todos os preparativos para o natal me cansam. Me cansam as propagandas na televisão, me cansam as mensagens para uma vida harmonioza e feliz, me cansa essa obrigação de comprar presentes, me cansam esses padres brigando pelo prestígio do mercado, me cansam todos esses movimentos de encontro difíceis de agüentar justamente quando as pessoas que encontro acreditam que é preciso agüentar nessa vida. Espero a cerveja acabar para dar uma caminhada na cidade sem me despedir dos últimos familiares que mantem a festa, que festa! Nossa. Caminho, olho os prédios antigos, passo pelas ruas onde brinquei na infância, vou procurar o prédio do colégio, vou procurar os esconderijos da adolescência, vou ser qualquer tempo além desse presente de relatar minha adultez num encontro de natal. Canço bem as pernas, os olhos e volto para jantar, me preparar para uma noite nessa pequena cidade natalícia. Amigos casados que ainda gostam de ouvir música, mas se recolhem cedo, vão para casa fazer sono ou sexo ou abandono através da televisão. Tento um último bar, tudo morto. Que bonito andar nessas ruas com esse efeito de luz de mercúrio. Bom mesmo vai ser chegar em casa, esticar os pés e fechar os olhos, sonhar com coisas diferentes, se possível. Não pode ser, que cachorros são esses? Nunca vi esse linguiça preto e esse vira-lata manchado, meu deus, eles estão vindo na minha direção. Mantenha-se com os punhos fechados. Eles não vão parar de latir, esses animais! Como é que vou sair daqui. Vou tentar uma fuga rápida. Não é possível, esse bicho não vai me deixar tirar o pé do lugar, será que terei que ficar aqui plantado? Como vou distraí-los? Ligar para quem? Muita humilhação ligar para a polícia pedindo resgate. Não! Fora de cogitação. Preciso que alguém passe por aqui, nessa cidade quase deserta. Cinco minutos, eu aqui no meio da rua e ninguém pára com esses carros de merda. Ai, ai... quem vem lá? Pára! Pára! Preciso de uma carona, esses cães não me deixam sair daqui. Que absurdo. Por fim tu, um amigo nessa situação absurda. Sim, vou ficar em casa. É, na casa dos meus pais. Estão vivos, passa lá uma hora para visitá-los. Não quero dar mais uma volta, essa história dos cachorros e eu parado ali no meio da rua, não. Chega! Meus pais, eles ainda moram perto do morro, sim. Valeu senhor y. 
Esse cara é inacreditável, finalizou o senhor y
Um Homem Chamado X tomou um copo de água e ficou feliz por deitar na cama, por estar escuro, por não ouvir uma única voz. Por não acreditar no papai noel há tempos!