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sexta-feira, 13 de maio de 2011

"Miséria é miséria em qualquer canto" Titãs

Tento sentir bonito e não tem como porque também as coisas devem contribuir para o belo e mesmo tentando pintar impressivamente não consigo fazer das paisagens mares ondulados de cor. E certamente não o faço porque sou outra depois de Van Gogh, como depois de mim muitos outros virão... no movimento discreto do tempo ou diferenciante quando tomado em pencas de anos (nas suas décadas, séculos, milênios e outros infinitos compartimentos do movimento). Sabes, tenho pensado que ando muito, muito crítica nos últimos vinte anos... também pensei que com as vivências eu me tranquilizaria com muitas coisas, mas o mundo não deixa. Parece estar convicto na sua missão de tornar as relações com tudo cada vez mais feias. Pois bem, voltamos à questão da beleza: através da leitura que estou fazendo do "Pesadelo Refrigerado" de Henry Milller, encontro um companheiro para expressar as misérias do mundo. Ele estava voltando depois de uma década na França/Europa para os Estados Unidos da América, sua terra de nascimento, em 1935 (início da segunda guerra mundial). Decide fazer um viagem, conhecer os Estados Unidos para se reconciliar e sair mais uma vez. O que isso quer dizer, imaginemos. Imaginemos esse deslocamento nada extraordinário dos estadunidenses... aliás, um território constituído desde sempre por deslocamentos (como a maioria ou todos, até não sabermos ao certo como a vida acontece), onde podemos marcar a conhecida corrida para o oeste em meados do século XIX, enquanto movimento massivo-de-trem-cavalos-carroças-panelas-cabeças-botas-whisky-sonhos-pesadelos-armas-abusos-ouro-suor-protestantismo-chapéus-morte-vida e outras maneiras, outros encaixes: eles tem uma vontade ou tinham uma vontade de andar, de conhecer a diversidade de seu grande país, de seu badalado território conquistado com sangue para a  divisão e unidade, para a liberdade e coerção e escravidão e mais. Antes de Miller quantos? Vários coletivos indígenas, aventureiros, desterrados, pesquisadores, políticos, civis, pobres, miseráveis, gananciosos, colonizadores, bastardos, missionários, loucos: todos loucos! Depois dele: beats, hippies, solitários, descontentes, por que não, os desterrados, pesquisadores, políticos, civis, indígenas (os que atravessaram as balas), missionários, colonizadores, bastardos, loucos: os que saem para entrar mais nos sentidos através das experiências que são produzidas e produzem relações. A maioria dos normais viaja a trabalho, de preferência de avião - "time is money". Vocês lembram do filme "Paris-Texas" do Win Wender? Para sentir, para estar em cada passo do caminho, para marcar o corpo com o caminho e o resto é poeira para que os outros também passem.
Entre todas essas pessoas que conhecem temos os que vêem as coisas de tempo em tempo mais feias e mais bonitas. Volto ao Miller, à década de 30 logo no início da segunda guerra e me pergunto insistentemente por que seu livro de viagem me diz tanto sobre o que está acontecendo agora, aqui na cidade onde vivo, ano de 2011, no século XXI? Cidade sulamericana, americana, americana... o eco da industrialização que marca as falas da maioria dos progressistas, para não generalizar, aqui no sul do Brasil (com certeza eu poderia generalizar sem grandes constrangimentos) é bem próximo ao que Miller escreve como ocupação-feitura de uma maneira triste de existir. Vocês e você e tu e ela e ele dirão que é muito fácil diagnosticar um problema e definí-lo por uma palavra: industrialização. E respondo: tenho que desenrolar a palavra, fazê-la sair de uma paz de conceito dado como entendido. Porque tenho esse desconforto, essa vontade de sair gritando para tudo e todos que está tudo errado: muito lixo no chão, na cidade, no mundo, nas cabeças! Muita merda de cachorro!  Falta de uma noção mínima de compartilhamento do espaço, uma vez que os cachorros tem prioridade na calçada! (atentem que não critico os cachorros, mas as circunstâncias de convívio) Sem contar os empurrões na faixa de segurança enquanto esperamos o sinal verde para pedestre. Se conseguirmos sair ilesos da raiva que predomina no trânsito talvez possamos nos aliviar da tensão. Motoristas tais soldados lutando cegamente. Atropelamentos para  pegar ônibus, mais empurrões e bundadas e cotoveladas para conseguir se acomodar. Uma série imensa de ações-desconcertos para os sentidos.
Sem palavras.
Sem sorrisos.
Com muita hipocrisia.
Não é sempre, não é com tudo e com todos. Porque se fosse eu acharia que essa pressão para a miséria seria o espaço de vida por excelência. E não é! Pelo presente. Pelo Passado.  Porque há beleza: atravessa resistente, combativa, flutuante.
Aos poucos vou escrever a minha viagem pela lógica da industrialização, difícil e cheia de palavras, do jeito como ela passa por mim aqui onde estou. Aliás, já estou fazendo isso.
"Riquezas são diferentes"!!!!