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terça-feira, 10 de dezembro de 2013

Reclamação

Começou o não pensamento limpando as lentes dos óculos. Porque é suficiente para a vida seu próprio aspecto turvo. Suficiente, porém insuportável. Há muito para se dizer sobre os acontecimentos desse ano de 2013, das novas formações de política de multidão até as rearticulações de poderosos abutres que rodeiam esfomeados todo e qualquer vislumbre de ação autônoma executada pelas pessoas pobres ou pelas pessoas sem privilégios garantidos pela tradição masculinista, branca e oligárquica do Brasil. Nesse sentido, muitos grupos, desde trabalhadores liberais como médicos e artistas, sem contar os políticos e religiosos até jovens estudantes radicais tanto para a direita quanto para a esquerda, tem produzido um mapa amplo com alguns pontos de onde é possível partir para uma análise um pouco menos confusa que aquelas que estão sendo oferecidas por vários dos grandes meios de comunicação do país, como televisão, rádio e jornais de circulação diária, sem mencionar as revistas reacionárias de plantão que - mereceriam um estudo de caso, VEJA bem - ainda vendem notícias distantes do que se poderia chamar de jornalismo sério. Jornalismo sério, pois que quero dizer com isso? Quero dizer que - marcando desde o início o posicionamento teórico e metodológico daquele que produz informação - esta deveria apresentar no corpo de seu texto, junto aos "fatos", a forma de investigação dos mesmos, os recursos utilizados na obtenção dos mesmos. Alguns poderiam dizer que isso inviabilizaria a produção imediata da informação e, por mim, talvez tenhamos que nos perguntar a quem interessa esse tipo de produção? Mesmo pensando na informação de combate à homogeneidade das formas produtivas da grande mídia não só nacional como internacional, fico pensando o quanto nos custam pequenas linhas de descrição, sem aprofundamentos, o que custa marcar uma passagem sem voltar para fazer dela rastros que se incrustem  no imaginário de luta como forma outra de agir no mundo. Enfim, pensando em tudo o que li nas redes sociais e ouvi nos meios hegemônicos de comunicação durante todo esse ano carregado de diferenças e complexidades, de alianças e traições, me pergunto o que ficou de entendimento das várias palavras que - na sua grande maioria - se perderam, ou melhor, somente engrossaram bancos de dados dos sistemas de controle do Estado? Volto à esse espaço de conversa - uma conversa um pouco monológica, é verdade - para exigir daqueles que fazem seu trabalho como comunicadores sociais que sejam comunicadores e não opinadores , trabalhadores cegos que somente endossam o ambiente de ignorância que estamos partilhando. Porque se qualquer um dos casos emblemáticos desse ano: manifestações de junho (anteriores e seguintes); greve dos professores; caso de corrupção mensalão; usurpação de direitos dos povos originários e quilombolas; contratação de médicos de outros países para atuação no Brasil; a presença de um pastor evangélico como presidente da Comissão de Direitos Humanos na Câmara dos Deputados Federal; o estatuto do nascituro prevendo a garantia de nascimento de seres gerados através de estupros; retrocesso nas discussões referentes ao direito de interromper a gravidez; as remoções de diversas comunidades pobres para a construção de mega estádios e outros equipamentos visando a Copa do Mundo 2014 e as Olimpíadas de 2016; torturas, mortes de Amarildos e prisões arbitrárias de manifestantes públicos; processo de terror de Estado executado pelas polícias militares estaduais com o aval do governo federal, só para citar alguns acontecimentos, receberam mais que manchetes e filmagens espetaculares, narrações à distância ou notas rápidas de um algum veículo de internet (obviamente que estou deixando de lado uma série de publicações especializadas e cronistas muito importantes que cumprem seu papel de investigação, posicionamento e comunicação), muito pouco se fez em termos de produção de um recurso que realmente contribua para um debate público forte e crítico. Essa é uma crítica a tod@s aqueles que fabricam informações e escondem suas fábricas, sonegam impostos intelectuais e lucram com a manutenção da burrice coletiva. Pois bem, temos que trabalhar nos pontos da rede e desenhar esse mapa sob pena de sermos soterrados pela infinita quantidade de falsos pontos apresentados, pelos interessados na manutenção do status quo, como verdades ou "fatos", como gostam de dizer por aí. As pessoas podem ver mesmo sem óculos.

1 comentários:

Alexander Pivato disse...

Uma excelente retrospectiva de fatos e assuntos para se refletir sobre os acontecimentos preocupantes do ano passado ainda presentes. Ótimo texto, parabéns.

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